Antes da entrada em vigor da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), o artigo 58, §2º da CLT/1943 previa que o tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não era computado na jornada de trabalho.
A exceção a essa regra ocorria quando o empregador fornecia a condução ao empregado, nos casos em que a empresa estivesse em local de difícil acesso ou não servido por transporte público.
Esse tempo gasto no transporte fornecido era chamado de horas in itinere e considerado como tempo à disposição do empregador. Mesmo essa exceção possuía aplicação limitada, pois os tribunais, em sua maioria, entendiam que locais estritamente urbanos não poderiam ser considerados de difícil acesso.
Além disso, quanto ao transporte regular público, a jurisprudência entendia que a simples insuficiência não autorizava o deferimento das horas itinerantes.
Entretanto, se houvesse real incompatibilidade de horários ou existisse transporte público em apenas parte do trajeto percorrido pelo empregado, era devido o pagamento das horas in itinere.
Com a entrada em vigor da Reforma Trabalhista, o art.58, §2º foi alterado, e as horas in itinere deixaram de ser consideradas tempo à disposição do empregador, o que gerou uma divergência interpretativa entre a lei trabalhista e a lei previdenciária.
Na prática, antes da Reforma Trabalhista, se o empregado demorasse uma hora no trajeto de ida e uma hora no trajeto da volta, a jornada prática dele na empresa seria de 6 horas.
Após a reforma, de acordo com a nova redação do artigo 58, §2º da CLT, as duas horas despendidas no trajeto de ida e volta ao trabalho já não deveriam ser contabilizadas.
Assim, os empregados passaram a cumprir as oito horas completas a cada dia.
Ocorre que o mesmo não acontece com o direito previdenciário.
A Lei nº 8.213/91, conhecida como lei previdenciária, em seu artigo 21, equipara o acidente de trajeto, também conhecido como acidente de percurso, ao acidente de trabalho. Isso quer dizer que o acidente sofrido pelo trabalhador, ainda que fora do local e horário de trabalho, mas durante o percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, por qualquer que seja o meio de locomoção, é equiparado a acidente de trabalho para fins previdenciários, sendo desnecessária a configuração de culpa do empregador para obtenção da estabilidade provisória com relação ao acidente.
Frente a essa mudança, o acidente de trajeto passou a ser motivo de debate, tendo em vista que, de acordo com a nova redação do art.58, §2º da CLT, não faria sentido o acidente de trajeto ser equiparado ao acidente de trabalho se o tempo em que o empregado está em seu trajeto de casa-trabalho ou trabalho-casa não é considerado tempo à disposição do empregador.
Nesse sentido, com as lacunas deixadas pela Reforma Trabalhista, a tendência deveria ser a de que não fosse configurado acidente de trabalho qualquer acidente de trajeto.
Contudo, os tribunais do trabalho têm entendido em sentido contrário, ou seja, que o acidente de percurso, seja ele casa-trabalho ou trabalho-casa, equipara-se ao acidente de trabalho.
O empregado faz jus à estabilidade acidentária, prevista pelo art. 118 da Lei 8.213/91, bem como aos depósitos do FGTS do período em que o contrato de trabalho ficar suspenso. Portanto, acidente de trajeto ainda se equipara a acidente de trabalho para fins previdenciários.
Com isso, é ideal que as empresas mantenham a prática de emissão do documento denominado Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), que é encaminhado para a Previdência Social, por meio do qual o funcionário obtém o auxílio-doença acidentário, sendo que a não emissão do documento pode sujeitar a empresa ao pagamento de multa ao Ministério do Trabalho.
A interpretação dada pelos tribunais onera o empregador de forma inapropriada, sem fundamento legal expresso.
É importante esclarecer que, ao diferenciar as consequências legais do acidente de trajeto para fins previdenciários e para fins trabalhistas, a legislação apenas desafogaria o empregador sem desproteger o trabalhador.
Isso, pois, por suposto, o acidente de trajeto capaz de afastar o empregado de suas atividades de trabalho ocasiona a proteção ao trabalhador com o recebimento de benefícios tais como auxílio-doença acidentário, auxílio-acidente, habilitação e reabilitação profissional.
A melhor interpretação da lacuna da lei seria isentar o empregador da responsabilidade e dos ônus pela estabilidade acidentária e desembolso com o FGTS durante o período e a atual tendência de interpretação é um retrocesso, já que os acidentes no trajeto casa-trabalho podem ser inúmeros, por exemplo, em razão do tráfego intenso nas grandes cidades e das rodovias pouco seguras no interior.
O empregador não tem qualquer controle sobre eles, portanto, não pode ser responsabilizado pelos acidentes ocorridos no trajeto.
Fonte: Jovem Pan